quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Pequim festeja os 60 anos da República Popular da China

O governo de Pequim festejará amanhã, quinta-feira, os 60 anos da República Popular da China, proclamada por Mao Zedong no dia 1º de outubro de 1949. Para tal recorrência, as autoridades chinesas prepararam um espetáculo à altura da festividade, certamente, organizado com o mesmo cuidado com o qual foi apresentada a inesquecível cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos do ano passado. O presidente Hu Jintao fará um pronunciamento oficial na simbólica Praça da Paz Celestial (Tiananmen) seguido de um imponente desfile das forças armadas chinesas, sinal da posição alcançada a duras penas nesses 60 anos, como uma das maiores potências militares, econômicas e políticas do mundo.

Mais uma vez, a atenção do mundo se voltará para o gigante asiático, e seus críticos mais acirrados estarão prontos a apontar o dedo contra os inevitáveis incidentes que perturbarão essa cerimônia. Conscientes disso, as autoridades chinesas - como já ocorreu às vésperas da abertura dos Jogos Olímpicos - reforçaram a segurança não apenas na capital, como em todo o país, especialmente nas províncias mais distantes e problemáticas, como o Tibete e o Xinjiang. A população de Pequim foi convidada a assistir à cerimônia pela TV, evitando os temidos aglomerados nas praças da cidade, onde 800 mil pessoas foram recrutadas para trabalhar junto aos policiais para garantir maior segurança.

Diante desse cenário, surge espontânea uma pergunta: quem é o verdadeiro protagonista dessa festa, a República Popular da China e, portanto, seu povo, ou o Partido Comunista Chinês, que conseguiu conservar sua supremacia, apesar das grandes mudanças internacionais?

A proclamação da República Popular da China significou, para Mao Zedong, seu líder, o fim do período de humilhação e exploração econômica, ao qual o povo chinês tinha sido submetido por mais de um século por parte das potências estrangeiras. Mao Zedong queria construir uma Nova China, livre da corrupção que caracterizara o governo nacionalista de Chang Kai-shek, obrigado pelas tropas comunistas a abandonar o país. A população saudou Mao como o libertador que garantiria um futuro brilhante, de fartura e igualdade para todos os chineses. Contudo, Mao não conseguiu realizar suas promessas. Após os primeiros felizes anos de reformas e de reconstrução da indústria pesada, sob inspiração do modelo soviético, uma série de passos em falso, dados pelo Grande Timoneiro, marcou o início da crise.

Os resultados catastróficos do famoso plano quinquenal, chamado de “Grande Salto em Adiante”, que deveria levar a China a superar a Inglaterra em quinze anos, provocaram a morte por fome de milhões e milhões de chineses. Após a morte de Mao Zedong, em 1976, foram revelados os números assustadores de mortes acontecidas naqueles anos: cerca de trinta milhões!

A chegada de Deng Xiaoping ao poder, em 1978, trouxe, novamente, à população chinesa, uma mensagem de esperança, com as promessas de prosperidade. Abandonando os dogmas da ideologia comunista, Deng abraçou uma nova ideologia, a do dinheiro, do enriquecimento rápido. Em pouco mais de 30 anos, Deng Xiaoping conseguiu reconstruir a economia chinesa, tornando o país protagonista inconteste do cenário internacional.

Foram 400 milhões os chineses que saíram da linha de pobreza, um número considerável, mais do que o dobro da população brasileira. O atual presidente Hu Jintao repete frequentemente o lema de seu governo: construir na China uma “sociedade harmoniosa”, ciente de vários fatores de conflito que colocam em perigo a estabilidade do país. Entre esses fatores, o desequilíbrio existente entre as regiões costeiras mais desenvolvidas e riquíssimas e as regiões do interior, subdesenvolvidas, com serviços básicos precários; a corrupção dos funcionários do partido, que distancia sempre mais a população dos seus governantes; a ausência de políticas públicas eficientes. A sociedade civil chinesa reclama urgentes reformas políticas, que não coincidem com o nosso sistema ocidental, diferente e, de fato, nem sempre bem sucedido em relação ao que promete.

O povo chinês está pedindo a palavra e, mais cedo ou mais tarde, os atuais líderes deverão ouvi-lo. Com o aniversário de 60 anos, data-símbolo de maturidade, talvez a República Popular da China encontre um novo caminho, pelas mãos do seu povo, mas, desta vez, de forma pacífica.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Mudanças climáticas em debate na 64ª Assembleia Geral da ONU

Ontem, teve início a 64ª Assembleia Geral da ONU, na cidade de Nova Iorque, convocada pelo secretário-geral Ban Ki Moon e que reúne os países membros da Assembleia Geral da ONU. Atualmente, os países membros são192, entre os quais 15 são membros do Conselho de Segurança da ONU (cinco permanentes com direito de veto: Estados Unidos, China, Federação Russa, França e Reino Unido, e dez membros eleitos rotativamente por dois anos). Muitos os temas que serão discutidos nesses dias: mudanças climáticas, aquecimento global, meio ambiente, crises regionais e proliferação de armas nucleares. As reuniões gerais serão intercaladas por encontros bilaterais entre os líderes mundiais. Muito esperado é o encontro organizado pelo presidente americano Barack Obama entre o líder palestino Abu Mazen e o israelita Netanyahu. Obama até agora não conseguiu convencer o governo israelita a bloquear os assentamentos nos territórios ocupados, por isso, prevalece o pensamento de que tal encontro não produzirá resultados imediatos para o processo de paz entre os dois governos.

Para hoje, estão previstas os pronunciamentos do presidente Lula, do líder líbico Gheddafi (membro eleito do Conselho de Segurança por dois anos), o presidente francês Sarkozy, o primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi, o primeiro-ministro iraniano Ahmadinejad, o líder russo Medvedev, o primeiro-ministro inglês Gordon Brown e o presidente chinês Hu Jintao. Aliás, espera-se que, nessa 64ª Assembleia Geral da ONU, a China possa oferecer uma contribuição significativa para sair do impasse da última reunião mundial, quando os governos chineses e americanos recusaram-se a mudar o quadro alarmante da poluição do planeta, pois um queria esperar pelo outro.

O Chefe do Departamento Climático da ONU, Yvo De Boer, anunciou que espera que a China saia da assembleia como a líder mundial dos programas de despoluição. Tal esperança fundamenta-se nos ambiciosos programas ambientais que a China apresentará nesses dias. Hu Jintao disse que até 2020, 15% da energia na China deverá ser produzida por fontes renováveis, além de declarar o empenho do país para uma melhor eficiência na produção e no uso de energias que levará a uma diminuição da poluição pelo tráfego de automóveis e no fechamento de indústrias poluentes. A China e os Estados Unidos são responsáveis por 40% das emissões mundiais de anidrido carbônico. Contudo, apenas o empenho da China, se respeitado, não é suficiente para melhorar a situação climática mundial. Ocorre também o empenho americano. Barack Obama, ao contrário do seu predecessor, que se recusou a assinar os Tratados de Kyoto, conseguiu recentemente fazer aprovar pela câmara de deputados um projeto de lei que reduzirá a emissão de gases poluentes, mas tal projeto ainda tem que ter a aprovação do senado.

O futuro do nosso planeta está nas mãos de poucos líderes mundiais. Tomara que esses debates possam resultar finalmente em políticas mundiais eficazes voltadas para o bem-estar de todos.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

As divergências entre Berlusconi e a Igreja Católica italiana

Há algum tempo, as vicissitudes pessoais do primeiro-ministro italiano, Silvio Berlusconi, são argumentos polêmicos de discussão acirrada entre seus amigos e inimigos políticos. Um escândalo sexual envolveu o primeiro-ministro nesse verão, quando vários jornais publicaram as fotos de Berlusconi ao lado de prostitutas desnudas durante as fabulosas festas por ele organizadas na sua mansão na ilha da Sardenha. O último escândalo, envolvendo também uma menor de idade, resultou no pedido de divórcio por parte da esposa de Berlusconi. Nesse turbilhão de acusações e ataques, os jornais oficiais da igreja católica, após um tempo de silêncio diplomático, não conseguiram ficar em campo neutro.

O jornal católico que denunciou abertamente os mal-feitos de Berlusconi foi o “Avvenire”, órgão oficial da Conferência Episcopal Italiana (CEI). O editorial de denúncia, de autoria do secretário geral da CEI, contra a libertinagem do primeiro-ministro italiano, obrigou o diretor do jornal Avvenire, Dino Boffo, a abrir o dique das pressões e reivindicações dos representantes católicos antiberlusconianos que se subseguiram nas páginas do “Avvenire” contra o primeiro-ministro italiano. Tal posição de denúncia contra o atual governo italiano gerou certo desconforto na Santa Sé, que se viu obrigada a intervir no mais alto nível das relações diplomáticas com o estado italiano. Por isso, o secretário de estado da Santa Sé (cujo cargo corresponde ao ministro das relações exteriores nos outros estados) decidiu marcar um encontro com Berlusconi por ocasião da visita de ambos à cidade de L’Aquila, vitimada por um terremoto no ano passado.

Trilhando o mesmo caminho, o jornal católico, “L’Osservatore Romano”, órgão oficial da Santa Sé, tentou minimizar os boatos que alarmavam sobre o conflito entre o estado Italiano e o Vaticano, distanciando-se da posição dos bispos italianos e tranquilizando a população sobre as relações entre os dois estados. A Santa Sé demonstrou mais uma vez sua orientação pragmática em âmbito internacional, recusando-se a entrar em tal polêmica. Mesmo assim, o jornal de centro-esquerda “La Repubblica” acusou o secretário de estado Tarcisio Bertone de querer sentar à mesa de Herodes, ao invés de acusá-lo publicamente, como fazia João Batista.

Quanto ao jornal “Avvenire”, seu diretor foi difamado pelo jornal “Il Giornale” – de propriedade do irmão de Berlusconi - acusando-o de ter molestado a esposa de um homem com o qual teria mantido relações. Mesmo após a acusação ter sido desmentida publicamente, o diretor do jornal católico preferiu demitir-se. Em sua defesa, acorreram até os tradicionais “inimigos” da igreja católica, os jornais de esquerda, demonstrando que a luta pelo poder tem a capacidade de transformar velhos inimigos em novos amigos e vice-versa. Em suma, como se diz no Brasil, um enorme “rolo” em bom estilo cinematográfico.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Livramento e Rivera - As cidades da Fronteira da Paz

Há pouco mais de duas semanas, por motivos de trabalho, estabeleci minha residência, junto com a família toda, aqui em Santana do Livramento, cidade gaúcha na fronteira com o Uruguai. Foi a segunda grande mudança em minha vida. A primeira foi quando de Roma mudei para o Brasil, vindo morar em Tubarão. Nos primeiros anos, nem deu para sentir saudades da Itália, tantas eram as novidades, os lugares bonitos que ia descobrindo, as novas amizades, etc. A única coisa de que senti falta em todos esses felizes anos na Cidade Azul, talvez, tenha sido não ter os contatos internacionais quase que diários aos quais estava acostumada desde a minha infância, em Roma. Na minha cidade natal - “caput mundi” como era chamada pelos antigos romanos - a vivência internacional sempre foi e continua sendo um dos elementos constitutivos da cidade.

Após alguns dias em Santana do Livramento, percebi que aqui não sentiria essa falta. Mesmo Livramento não sendo localizada no que se pensa ser o centro do mundo, percebi que as raízes históricas, políticas e econômicas de Santana do Livramento afundam e alimentam-se em terras caracterizadas pela internacionalidade. Basta dar um passeio nas ruas da cidade e prestar ouvido aos idiomas falados nas ruas, três pelo menos: português, espanhol e árabe (esse último pela presença em Santana de uma significativa comunidade muçulmana).

Avançando na nossa caminhada, chega-se em minutos à fronteira com o Uruguai, fronteira aberta, marcada apenas pelas duas bandeiras nacionais que esvoaçam alegremente no Parque Internacional situado entre os dois países. As minhas filhas logo brincaram de pular de um país ao outro, felizes dessa nova experiência. Olhando essa brincadeira, fiquei refletindo e percebendo quão peculiar é essa fronteira onde Deus nos enviou e qual seria o papel dessa cidade que, junto com a vizinha Rivera, deram vida à significativa e promissora Fronteira da Paz.