quarta-feira, 21 de julho de 2010

A França aprova lei contra a burca (1)

Semana passada, após meses de debates, o parlamento francês aprovou uma lei que proíbe o uso de esconder o rosto em lugares públicos. Consequentemente, o uso da burca tornou-se ilegal em território francês. A lei foi aprovada com 355 votos a favor e apenas um contra. Ela prevê seis meses de adaptação, durante os quais não serão aplicadas multas.

A lei proíbe que o rosto seja coberto de maneira integral, definindo as exceções a tal lei como em caso de doenças, enfaixamentos, fantasia de Carnaval, etc. Após esse primeiro período de reflexão e assimilação, a multa para quem transgredir a lei, vestindo a burca, será de 150 euros. Porém, multas mais pesadas serão aplicadas para quem obrigar alguém a vestir a burca. A multa prevista nesse caso é de 30 mil euros ou um ano de prisão (o dobro se a pessoa obrigada for menor de idade).

Li nesses dias, no site de Asianews, um interessante artigo sobre essa lei, escrito por Samir Khalil Samir, natural do Egito, professor de estudos islâmicos e história da cultura árabe na Universidade de Beirute.

Comentando a decisão do governo francês de proibir a burca, ele evidenciava como o uso extensivo da burca seja um fenômeno bastante recente, pois, segundo a polícia francesa, alguns anos atrás, apenas uma centena de mulheres usava a burca. Atualmente, na França, são ao menos duas mil as mulheres que a usam. Da mesma forma, no Egito, em 2001, apenas algumas centenas de mulheres usavam a burca, e hoje 16% da população do país usam essa vestimenta.

Tentando encontrar as razões dessas mudanças, o professor Samir, antes de tudo, sublinhou que no Corão ou na tradição islâmica (Sunna) nunca se fala de burca, portanto, ele conclui: “não estamos falando de um costume islâmico”. A burca é diferente do chador ou do niqab. Contudo, é um hábito que se encontra apenas em alguns países de tradição islâmica. Mas, segundo o professor Samir, ela continua sendo uma exceção e não a regra. Com efeito, em outros países muçulmanos, a burca é proibida, por não fazer parte de suas tradições, como acontece na Tunísia.

Na Turquia, ela é proibida para respeitar a laicidade do Estado. No Egito, em novembro de 2009, o reitor da universidade islâmica Al-Azhar, Mohammad Sayyed Tantawi, a maior autoridade religiosa no Egito, proibiu o uso da burca entre as estudantes, pois dizia que esse uso não tinha nenhuma ligação com o Islam. Em fevereiro de 2010, o primeiro ministro egípcio, Ahmad Nazif, definiu a burca como “uma negação da mulher”.

Continua na próxima semana...

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Cooperação Sul-Sul

Na semana passada, realizou-se a reunião anual do G-7 mais a Rússia, e do G20, grupo este que reúne países desenvolvidos e emergentes, na busca de novos caminhos que ajudem todos os países a sair da crise econômica que abalou recentemente as economias mundiais. Entres os integrantes desse grupo, nos últimos anos, destacou-se a ação internacional de países como Brasil, Índia, África do Sul e China, que estão liderando um novo tipo de relacionamento internacional, a assim chamada Cooperação Sul-Sul. Na verdade, esse tipo de cooperação, que reúne os países em desenvolvimento localizados no hemisfério sul, afunda suas raízes no período da primeira década de 1960, quando se formou o Grupo dos 77.

O grupo foi implantado em 1964, dentro da estrutura da Unctad (Conferência para o Comércio e Desenvolvimento das Nações Unidas), em Genebra, com o objetivo de fornecer meios aos países do sul de articular e promover os interesses econômicos coletivos. Outro objetivo era melhorar a capacidade de negociação dos países periféricos dentro do sistema internacional, promovendo, ao mesmo tempo, a cooperação para o desenvolvimento entre os países pertencentes ao hemisfério sul.

Em 1978, sempre no seio das Nações Unidas, uma nova iniciativa veio reforçar a cooperação entre os países do sul do mundo. Tratava-se do Plano de Ação de Buenos Aires, resultado da conferência realizada na capital argentina, em 1978, e que reuniu 138 países. O Plano de Ação apresentava 38 recomendações para a implantação de um programa de Cooperação Técnica entre os Países em Desenvolvimento (TCDC). A este fim, foi criada uma Unidade Especial de Cooperação Sul-Sul, dentro do Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas. Contudo, as décadas se passaram e tal programa não alcançava os fins para os quais tinha sido criado.

O modelo de cooperação até então atuado se baseava na assistência oferecida aos países do sul pelos países do norte usando metodologias criadas nos países desenvolvidos. O passo decisivo para uma re-emergência de uma Cooperação Sul-Sul mais eficaz ocorreu apenas no início do atual século, sobretudo graças a países emergentes cujo modelo de desenvolvimento deu certo e que suscitaram esperança no resto dos países do hemisfério sul.

Entre eles, o Brasil, a China, a Índia e a África do Sul, que aceitaram desempenhar um papel de liderança no sistema de Cooperação Sul-Sul. Tais países, reconhecidos como líderes regionais, estão tentando ensaiar um novo modelo de cooperação e diplomacia, dessa vez, estruturado a partir dos países do hemisfério sul, evitando com isso reproduzir erros já cometidos pelos países do hemisfério norte. A aplicação desse novo projeto pode ser observada a partir de duas iniciativas valiosas de cooperação: o Fórum IBSA, formado em 2003 por Brasil, Índia e África do Sul e o grupo do Bric (Brasil, Rússia, Índia e China).

A cooperação empreendida por tais grupos não se limita a iniciativas comerciais e de desenvolvimento industrial, mas atinge áreas fundamentais como educação, saúde e proteção social. A presença desses novos atores no cenário internacional e sua intenção de criar modelos alternativos de cooperação gerou uma nova esperança para povos que até então ficaram a mercê dos tradicionais centros de poder, sendo considerados apenas como a periferia do mundo.