quarta-feira, 12 de maio de 2010

Turquia – candidata perene à União Europeia

O debate sobre a aceitação ou menos da Turquia como membro pleno da União Europeia teve início logo após a constituição da Comunidade Econômica Europeia, criada com o Tratado de Roma, em 1957. Com efeito, no mesmo ano, a Turquia manifestou seu interesse em ingressar na nova comunidade.

Para conhecer melhor a história desse país e entender as razões que dificultam a integração da Turquia no espaço europeu, ocorre voltar um pouco no tempo, no momento da proclamação da república da Turquia, que surgiu sobre as ruínas do antigo Império Otomano. Nas últimas décadas do século XIX, o Império otomano reduzira-se a um estado semi-colonial onde as potências estrangeiras gozavam de numerosas áreas de extraterritorialidade e isenção de impostos.

Além disso, as nações estrangeiras protegiam os cristãos otomanos que puderam, dessa forma, ter acesso à educação europeia e progressivamente tomaram conta dos setores estratégicos da economia turca. A nova república, fundada em 1923 por uma revolução modernizadora liderada por Mustafá Kemal Ataturk (Ataturk significa pai dos turcos), mudou o rumo do país, instituindo um regime laico, com o apoio dos militares e procurando criar uma burguesia nacional nas mãos dos muçulmanos até então discriminados. A maioria dos cristãos fugiu para a Grécia.

Após a crise mundial de 1929, o estado turco optou por uma política oficial chamada “estatism”, através da qual a econômica seria controlada quase que exclusivamente pelo estado. No período que seguiu à Segunda Guerra Mundial, o primeiro-ministro Ismet Inonu, sob pressão anglo-americana e contra a vontade do partido, introduziu no país o sistema multipartidário, apoiando os grupos de reformadores moderados que solicitavam uma liberalização da economia nacional, presa até então ao modelo soviético.

Tal inversão de política pública obedecia a motivos essencialmente pragmáticos. Para se defender do expansionismo da URSS, a Turquia procurou a proteção dos Estados Unidos que, em 1947, lançava a Doutrina Truman com o intuito de conter a expansão soviética. A partir daquele ano, a Turquia tornou-se parte integrante do bloco ocidental. Foi um dos primeiros países a enviar tropas de auxílio aos Estados Unidos na Guerra da Coréia, em 1950.

Em 1952, a Turquia tornou-se membro da OTAN. Sob sugestão dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha, procurou formar redes de cooperação com os países do Oriente Médio, por meio do pacto de Bagdá, assinado pelo Reino Unido, Paquistão, Irã, Iraque e Turquia e, em seguida, por meio da Organização do Tratado Central, junto com os Estados Unidos, Irã e Paquistão. A tentativa de cooperação regional não teve sucesso, sobretudo pelo surgimento e rápida difusão do movimento socialista árabe, liderado pelo presidente egípcio Nasser.

A Turquia passou a ser percebida, pelos seus vizinhos árabes, como um fantoche nas mãos das potências ocidentais. Para fugir desse isolamento, o país apresentou à nascente Comunidade Econômica Europeia o pedido de integração como novo membro. A Europa demonstrou interesse e apoiou tal pedido, pois a Turquia era considerada um país estrategicamente importante pela sua localização às portas do Oriente Médio, sobretudo, no âmbito da defesa e da estabilidade regional.

Até 1974, a Turquia e CEE mantiveram ótimas relações. A Turquia fazia questão de se apresentar como uma democracia liberal, com uma economia ascendente, tentando, com isso, preencher os pré-requisitos dos candidatos à CEE. Além disso, o país tornou-se o principal fornecedor de trabalhadores imigrados para a Europa ocidental, sobretudo para a Alemanha. Desde 1974, novos acontecimentos esfriaram as relações com a Europa. A invasão turca da ilha de Chipre foi um dos fatores predominantes desse distanciamento, assim como o golpe militar, em 1980, que tentou barrar os projetos democráticos turcos.

Com o fim da Guerra Fria e o desmantelamento dos governos comunistas no Leste Europeu, a Europa priorizou os novos possíveis candidatos ao bloco europeu, em detrimento de suas relações com a Turquia, que já não representava mais o mesmo valor estratégico do período da Guerra Fria.

Atualmente, a adesão da Turquia à União Europeia permanece assunto de debate entre os governos europeus. Não se pode esquecer que a Turquia desempenha ainda um papel importante na área do Mediterrâneo e no Oriente Médio, pois 97% de seu território estão localizados na Ásia. De outro lado, o ingresso da Turquia, de maioria muçulmana, desperta em alguns governos europeus a ideia de abandono definitivo de uma Europa culturalmente homogênea e com as mesmas raízes religiosas, mesmo se, desde sua fundação, a república laica da Turquia optou claramente pela separação entre Igreja e Estado.

A opinião pública turca encontra-se igualmente dividida entre os grupos que consideram a perspectiva de ingresso do país na União Europeia como um forte estímulo ao crescimento econômico e social do país, e o grupo dos radicais islâmicos que desejaria retomar o projeto de um mercado comum na região do Oriente Médio.

Há, portanto, muitos elementos em jogo que devem ser considerados em relação à aceitação da Turquia como membro pleno da União Europeia, e que certamente atrasarão ainda por algum tempo a solução de tal impasse.

Um comentário:

Rafael de Castro disse...

Olá professora Anna,
Gostei muito do artigo sobre a Turquia, algumas informações eu ainda não sabia- que durante um período ela já foi bem próxima da União Européia e que por causa de um período de ditadura se afastou.
Gostaria de saber mais sobre as relações bilaterais entre Brasil e Turquia- econômicos e políticos-, e também sobre a embaixada e os consulados brasileiros- quem são os embaixadores e cônsul brasileiros em território Turco? Seria interessante se fizesse outros artigos.
Obrigado por nos ajudar- nós leitores- com um pouco do seu conhecimento a nos enriquecer também.

Rafael de Castro.