quarta-feira, 21 de maio de 2008

China e Mianmar - reações opostas diante da tragédia

Nesta primeira metade de maio, desastres naturais devastaram dois países da Ásia: Mianmar (antiga Birmânia) e a República Popular da China. Em Mianmar, o responsável foi o ciclone Nargis. Na China, foi o terremoto, que teve o seu epicentro na região do Sichuan, mas foi sentido até em Pequim, distante do Sichuan mais de 1000 quilômetros. Os dois países são parceiros político-econômicos. A China está interessada nos recursos energéticos de Mianmar – petróleo e gás- que atraem o interesse também das vizinhas Índia e Rússia. No ano passado, o governo chinês defendeu o governo de Mianmar, vetando a proposta da ONU de pressionar a Junta Militar do país por meio da aplicação de sanções. Por esta sua postura foi acusada de favorecer e encobrir os crimes cometidos pelo regime ditatorial birmanês. Contudo, nestes últimos dias, o governo chinês demonstrou não ser tão parecido com o governo birmanês. Este último, após o desastre, fechou por vários dias as fronteiras do país a qualquer ajuda internacional, certamente por temer que ingerências internacionais possam enfraquecer o seu poder político. Tal cruel decisão custou a vida de milhares de birmaneses que precisavam de ajuda imediata. Após este período, revendo sua posição, aceitou que alguns países vizinhos enviassem ajuda, mas pretendeu distribuí-las autonomamente, atrasando ainda mais a assistência à população. Como se isso não fosse suficiente, realizou, naquelas dias, votações em favor de uma nova Constituição para o país, o que ampliou de forma ilimitada os poderes dos militares. Milhares de birmaneses foram obrigados a voltarem às suas cidades para participar das votações, sendo ameaçados de prisão caso ousassem votar contra a Junta Militar.

A reação do governo chinês à tragédia natural foi completamente diferente. O esforço de mobilização nacional foi imediato. As autoridades chinesas aceitaram, sem restrições, a ajuda internacional, lançando apelos para obter equipamentos tecnológicos sofisticados que os ajudassem a encontrar pessoas debaixo dos escombros. Os escândalos das tantas escolas desmoronadas, mesmo se de recente construção, desta vez não foram escondidos nem minimizados. A imprensa nacional e internacional pôde divulgar os acontecimentos sem restrições. O governo chinês anunciou a abertura de uma investigação sobre o desmoronamento das escolas. A indignação popular é grande porque todo mundo sabe que o desrespeito das normas anti-sísmicas na construção das escolas foi devido à corrupção existente entre os burocratas do governo chinês. Mas é importante reconhecer que a China demonstrou enormes progressos em relação à abertura e pronta intervenção. Em 2003, em ocasião da Sars (gripe aviária), o governo chinês não demonstrou a mesma abertura, colocando em risco a saúde não somente de sua população, mas do mundo inteiro. Desta vez, as autoridades chinesas deixaram campo livre às ONGs e aos milhares de voluntários – de todo o país – que, de forma espontânea, decidiram ajudar a população do Sichuan.

A ajuda imediata à população foi possível também graças ao progresso econômico alcançado pela China. Na província do Sichuan foi construído um aeroporto intercontinental e uma moderna rede rodo e ferroviária, graças às quais a proteção civil pôde agir imediatamente.

Em Mianmar, mesmo se as fronteiras não tivessem sido fechadas, as equipes de resgates teriam tido muitas dificuldades em alcançar a região devastada justamente por causa do subdesenvolvimento econômico. O regime autoritário chinês, desta vez, se saiu melhor que a ditadura birmanesa. Certamente estava consciente de estar sob a atenta observação internacional. No ano das Olimpíadas a China não poderia falhar em demonstrar a sua eficiência e abertura. Talvez os governantes chineses quisessem, por meio desta prontidão e eficiência, afastar da lembrança a antiga tradição chinesa, segundo a qual fenômenos devastadores - como os terremotos - seriam sinais do céu que expressariam a perda do Mandato Celeste dos imperadores e garantiriam o direito de rebelião ao povo. Não esqueçamos que o grande terremoto de 1976, na China, antecedeu a perda definitiva do poder de Mao Zedong.

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