quarta-feira, 5 de novembro de 2008

A República Democrática do Congo lança um SOS ao mundo

Nas últimas semanas, enquanto a atenção da opinião pública internacional estava absorvida pelos desenvolvimentos da crise financeira internacional e pelo resultado das eleições presidenciais americanas, no coração da África uma nova guerra civil marcava o início de uma crise humanitária de dimensões catastróficas.

A República Democrática do Congo (RDC) - país localizado na região central do continente africano - é o palco deste novo e triste capítulo da história africana. Desde agosto passado, na província de Kivu - região oriental do país -, combates intensos entre as tropas governistas e as milícias do CNPD (Conselho Nacional para a Defesa da Paz), lideradas por Laurent Nkunda, obrigaram milhares de pessoas a deixar suas casas. Nestas últimas semanas a situação piorou. Segundo dados da ONU, seriam até agora 250 mil as pessoas que foram obrigadas a abandonar as próprias casas. São milhares de seres humanos caminhando sem rumo pelo país em busca de um refúgio seguro que, num país devastado há anos pelas contínuas guerras civis, praticamente não existe. Por semanas, as ajudas humanitárias não conseguiram chegar até a região dos conflitos. Na quarta-feira passada, o cessar-fogo permitiu às agências humanitárias, lideradas pela ONU, organizar comboios de ajuda. Ontem, o primeiro comboio da ONU conseguiu chegar à aldeia de Rutshuru, onde havia um dos maiores campos de refugiados, mas nos últimos meses foi transformado em base militar dos rebeldes do CNPD. Por isso, quando o comboio chegou, não encontrou mais ninguém. Os refugiados, que conseguiram escapar do massacre de 1994, deixaram a relativa segurança do campo por medo de não conseguirem escapar novamente da violência. O ministro do exterior britânico, David Miliband, em missão na África junto ao ministro francês Bernand Kouchner, alertou que seriam cerca de 1 milhão e 600 mil desalojados. O risco de epidemias e morte por desnutrição é altíssimo. A coordenadora da organização humanitária Médicos sem Fronteiras, descreveu assim as condições do povo congolês: “As pessoas não sabem para onde ir, caminham por quilômetros procurando refúgio por alguns dias, mas sabem que devem continuar andando, sem rumo. Muitas vezes, caminham sem sapatos e protegendo-se da chuva com capas improvisadas. Muitos têm o estômago inchado pelas raízes e ervas que comeram ao longo do caminho. Outros não comem nem isso há dias. Param quando o cansaço ou a dor lhes impede de caminhar. Então caem e dormem na estrada”. Os refugiados tiveram suas casas queimadas durante os conflitos, não possuem mais nada e continuam sendo alvo da violência feroz dos rebeldes e das tropas governistas. O líder das milícias do CNPD, Laurent Nkunda, afirmou estar lutando para proteger a população de etnia tutsi que, segundo ele, estaria sendo ameaçada pelas tropas governistas da etnia hutu. Ele reivindica negociações diretas com o governo congolês. O presidente da República Democrática do Congo, Joseph Kigali, recusou-se a negociações diretas, mas se declarou disposto a participar de uma reunião sob a égide da ONU e das organizações regionais africanas. Tal reunião deverá se realizar na próxima semana, na capital do Quênia (Nairobi). Entretanto, a missão permanente de paz da ONU, presente no território congolês desde o ano de 2000, tenta, como pode, ajudar os refugiados.

É uma situação complexa, cujas raízes se perdem no passado doloroso do continente africano, retalhado e explorado pelas potências européias do séc. XIX, e vítima dos conflitos étnicos localistas. Há pessoas que afirmam que os conflitos atuais são causados por problemas tribais de exclusivo interesse africano. Todavia, diversos analistas políticos internacionais afirmam que não se trataria somente disso. Por trás das divisões entre etnias e povos haveria também interesses políticos e econômicos externos. A região oriental da RDC é riquíssima em minérios preciosos, como ouro e diamantes. Empresas multinacionais estão interessadas em manter o país dividido para poder desfrutar de tais riquezas. Existiria até um projeto de criação de um novo estado nesta região, que se chamaria “República dos Grandes Lagos”. A África continua sendo vítima de si mesma (conflitos étnicos) e dos falsos amigos estrangeiros.

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