quarta-feira, 12 de março de 2008

As mulheres de Kabul

O Dia Internacional da Mulher - considerando a tragédia das operárias de 1908 em New York como dia de sua instituição - completou cem anos no último sábado. Oficialmente, a Festa Internacional da Mulher foi instituída, por resolução das Nações Unidas, somente em 1977. A partir daí, todo ano, as Nações Unidas propõem um tema de reflexão. O tema escolhido para este ano foi: “Investindo em Mulheres e Meninas” . O secretário-geral das Nações Unidas explicou, na sua mensagem do dia 8 de março, o porquê desta escolha. “Até agora” – ele declarou – “não se investiu suficientemente na luta contra a desigualdade entre homens e mulheres e contra a violência que infelizmente ainda caracteriza a vida de muitas mulheres no nosso planeta”.
Nos dias que precederam e seguiram a celebração do Dia Internacional da Mulher ouvi muitos comentários, a maioria de mulheres que se declaravam insatisfeitas com esta festa. Até então, para mim, 8 de março era só um dia como os outros, acrescido de votos de felicidades recebidos pelo meu esposo e amigos. Neste ano, perguntei-me mais sobre o significado desta festa. Seria apenas uma festa comercial, para vender flores, ou realmente um dia de comemoração? Excluí logo a segunda opção, pois, infelizmente, ainda há muitas situações de violência no mundo que não permitem comemoração. Veio-me em mente, então, as reivindicações dos movimentos feministas pedindo a todo custo a emancipação e igualdade das mulheres, mas isto também me resultou insuficiente.

O que ficou, então, desta festa? Encontrei a resposta nas razões da ONU quando da instituição do Dia Internacional da Mulher. Na época, a Assembléia Geral das Nações Unidas citou duas razões: a primeira era reconhecer o fato que a conquista da paz, o progresso social e o pleno respeito dos direitos humanos requerem a ativa participação das mulheres; a segunda, reconhecer a contribuição delas para reforçar a paz e a segurança internacional.

O papel da mulher, portanto, foi reconhecido como fundamental não apenas no âmbito da própria família, mas para a sobrevivência e harmonia da sociedade humana. Todavia, em vários países lhes é negada a realização de tal desafio público.

Por isso, o Dia internacional da Mulher serve para nos lembrar dos milhões de mulheres que ainda vivem sob a opressão de alguns sistemas político-culturais. Para elas, este dia permanece especial, pois, muitas vezes, é o único em que a opinião pública internacional lembra de sua situação. Falo, por exemplo, das mulheres do Afeganistão. Lendo suas histórias, impressionou-me o fato de festejarem com muito entusiasmo o Dia Internacional da Mulher, por viverem num regime que lhes nega a liberdade.
Este ano, em Kabul, capital do Afeganistão, a missão da ONU distribuiu flores às mulheres inteiramente cobertas com a burka, obrigadas a espiar o mundo através dos pequenos furos contidos na altura dos olhos. Elas estão proibidas de estudar, de trabalhar, de caminhar nas ruas sozinhas, e até de serem atendidas em hospitais públicos. As mais ricas têm acesso a clínicas particulares; as pobres são deixadas morrer. Casamentos forçados antes dos 18 anos de idade, violência física, estupros, são fatos ordinários da vida das mulheres de Kabul.

Contudo, elas não se renderam. A RAWA - Associação Revolucionária das Mulheres do Afeganistão -, fundada por uma mulher afegã em 1977, reúne mulheres e homens que lutam pela democracia e contra a violência do sistema político-cultural afegão. No último dia 8 de março, os membros da RAWA reuniram-se para festejar este dia com cantos e declamações de poesias. Escreveram uma mensagem em que expressaram o significado deste dia para as mulheres do Afeganistão: um dia para dar voz aos sofrimentos das mulheres e, sobretudo, para renovar o pacto em favor da democracia, sonhando com um Afeganistão livre de todo tipo de fundamentalismo.Visto a partir das mulheres encarceradas na burka, o Dia Internacional da Mulher passou a ser um dos mais bonitos do ano.

Um comentário:

AlanMartins disse...

O sentido encontrado pra justificar tal data é realmente nobre, porem, no local onde moramos e em tantos outros essa data não passa de uma data comercial e pior muitas pessoas nem querem saber o real motivo, pois importam-se tão somente com os mimos de tal data.