quarta-feira, 5 de março de 2008

Crise latino-americana: em busca da autonomia perdida

Estamos em meio a uma grave crise internacional e, desta vez - e não é o caso de nos orgulharmos - a crise não está muito longe.

Ela foi gerada pela incursão do exército colombiano em território equatoriano, no último sábado, dia 1 de março. A justificativa da invasão oferecida pelo presidente colombiano, Álvaro Uribe, foi legítima defesa, questão de segurança contra os guerrilheiros das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). A resposta do presidente equatoriano, Rafael Correa, foi a acusação de massacre e invasão da soberania nacional. As duas versões sobre a modalidade do acontecimento são diferentes, mas o fato de a Colômbia ter invadido o território equatoriano nunca foi negado nem pelo próprio governo colombiano. Pelas leis do Direito Internacional a invasão territorial é considerada um fato grave, sem justificativas. O bombardeio por parte da força aérea colombiana aconteceu na fronteira com o Equador, num espaço aéreo que a Colômbia afirma não ter violado. Mas após o ataque, a milícia colombiana atravessou a fronteira para verificar o resultado de sua ofensiva. Todos os ocupantes do acampamento, 17 guerrilheiros das Farc, morreram. Entre eles estava o numero 2 das Farc, conhecido como Raúl Reyes (seu nome verdadeiro é outro). A Colômbia alega que existiam motivos válidos que justificavam a invasão. Segundo Uribe não foram as milícias colombianas a abrir fogo. Elas simplesmente teriam respondido ao ataque. A questão é complexa e não é fácil julgar quem está do lado certo. Aliás, será que existe um lado totalmente certo ou podemos afirmar que há o certo e o errado em todos os lados? A Colômbia luta há décadas contra as Farc, movimento fundado em 1964 com o objetivo de derrotar o governo conservador colombiano e instaurar um governo marxista, por meio da luta armada. Em 1990, as Farc mudaram de estratégia e começaram a seqüestrar pessoas (atualmente são 700 os seqüestrados nas mãos das Farc). As Farc são um dos exércitos de guerrilha mais poderosos e ricos do mundo. Controlam vastas áreas internas da Colômbia, organizando o narcotráfico. Odiadas pelo governo colombiano, recebem a simpatia de alguns governos vizinhos, como o da Venezuela e, aparentemente, do próprio Equador, visto que bases das Farc são permitidas em território fronteiriço venezuelano e equatoriano. O presidente Chávez sempre se negou a considerar as Farc como terroristas, reconhecendo a legitimidade política de sua ação. Ele criou uma região de influência política da qual fazem parte a Bolívia, desde a eleição do presidente Evo Morales, e o próprio Equador. Estes três governos se dizem de esquerda, de inspiração bolivariana, e consideram o presidente Álvaro Uribe inimigo do continente sul-americano, por ser conservador de direita – segundo eles - ligado aos Estados Unidos, inimigo declarado ou bode expiatório escolhido por eles.

Para o Equador o último ato de agressão territorial da Colômbia não foi o único. Há tempos que a Colômbia estaria agredindo de várias formas a população equatoriana. Correa exigiu um ato de desculpa formal ao presidente Uribe para que possa se resolver pacificamente esta crise. Uribe apresentou desculpas, mas não nos termos exigidos pelo Equador. O Equador, então, decidiu fechar a sua embaixada na Colômbia e anunciou a ruptura das relações diplomáticas com o estado vizinho.

Diante desta crise surgiram duas posições diferentes de países vizinhos: evidenciar os pontos de divergência e provocar uma crise ainda mais grave, como está fazendo o presidente venezuelano Hugo Chávez (ele enviou dez batalhões de milícias venezuelanas à fronteira com a Colômbia e fechou a embaixada venezuelana em Bogotá); ou sublinhar os pontos de convergência e tentar a resolução pacífica do impasse, como está fazendo o Brasil desde o início da crise, procurando amenizar a tensão. Isto não significa desconhecer ou não considerar que existem questões a serem resolvidas, mas ocorre – como dizia ontem o ministro Celso Amorim – estabelecer prioridades. A OEA (Organização dos Estados Americanos) reuniu-se ontem sob iniciativa brasileira e deseja investigar os fatos e trabalhar pela resolução da crise, em base às leis do Direito Internacional. Tomara que mais países latino-americanos sigam o exemplo brasileiro, e não o do aventureiro Chávez, colocando-se não do lado colombiano ou equatoriano, mas em favor da busca da harmonia perdida.

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