quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Alexander Solzhenitsyn: a voz da consciência russa

No domingo passado, morreu Alexander Solzhenitsyn, um dos maiores escritores do século XX. Solzhenitsyn nasceu em 11 de dezembro de 1918 na pequena cidade de Kislovodsk, na região do Cáucaso, localizada na então União Soviética. Seu pai morreu durante a guerra, seis meses antes de ele nascer. Desde sua adolescência, manifestou vontade de se tornar escritor. Na cidade onde cresceu não havia faculdades de literatura e as condições financeiras de sua mãe não lhe permitiram mudar-se para Moscou, como ele sonhava. Formou-se em Matemática e Física, em 1941, matérias pelas quais também demonstrara particular aptidão. Solzhenitsyn tornou-se soldado do exército russo, combatendo por dois anos no segundo conflito mundial. Das trincheiras, enviava cartas a um seu amigo de infância, criticando, às vezes, o governo de Stalin. Por essas críticas, Alexander foi preso, em 1945, e condenado a oito anos de prisão nos campos de trabalho forçado. Graças à sua formação matemática, passou os primeiros quatro anos trabalhando num instituto de pesquisas para onde eram enviados prisioneiros cientistas. Depois, porém, foi enviado a um campo de concentração, no gelo do Cazaquistão, onde trabalhou como pedreiro, mineiro e metalúrgico. Neste período foi-lhe diagnosticado um câncer. As suas condições de saúde começaram a piorar. Em 1954, Alexander chegou quase morto à cidade de Tashkent, no Uzbequistão, onde finalmente foi operado e curado. Durante todos esses anos, Solzhenitsyn escrevia, às escondidas, poemas e contos. Ele memorizava os poemas e depois os queimava. Todo dia, usando um terço, declamava seus poemas, um em cada conta, para não os esquecer. Quando alguém perguntava, dizia que estava rezando. Os relatos de sua prisão – que formarão sua obra mais famosa, O Arquipélago Gulag - eram escritos em minúsculas folhas de papel, que eram enterradas, para a polícia não o descobrir. Numa autobiografia, escrita para a ocasião da entrega do Prêmio Nobel da Literatura, ele disse: “Durante todos os anos, até 1961, eu não apenas estava convencido que sequer uma linha por mim escrita jamais seria publicada durante minha vida, mas, também, raramente ousava permitir que meus amigos lessem o que havia escrito por medo que o fato se tornasse conhecido”.

As mudanças políticas na Rússia dos anos 50, mudaram, por alguns anos, o destino de Alexander. De fato, depois da morte de Stalin, em 1956, Nikita Krushev, que assumiu o comando da União Soviética, começou o processo de desestalinização, denunciando abertamente os crimes cometidos por Stalin. Em 1961, em ocasião do XXII Congresso do Partido Comunista da União Soviética (PCUS), o governo convidou os escritores russos a unirem-se à desestalinização.

Solzhenitsyn conseguiu, então, publicar, com a aprovação oficial de Krushev, seu primeiro romance: Um dia na vida de Ivan Denisovic, diário nos campos de trabalho forçado durante a ditadura staliniana. Graças a esse romance, Solzhenitsyn tornou-se conhecido também no mundo ocidental. Continuou suas críticas e, por isso, foi expulso em 1967 da união dos escritores russos. Em 1970, o Prêmio Nobel de Literatura lhe foi dado, mas o governo russo não permitiu que o recebesse. Solzhenistyn não poupou esforços e palavras para denunciar o arbítrio das leis soviéticas e o drama do povo russo transformado pelo regime comunista em “inimigo de si mesmo”, como ele afirmou naqueles anos. Em 1974, após tirar dele a nacionalidade russa, o governo o expulsou. Alexander passou dois anos na Suíça e o resto do exílio nos Estados Unidos, onde permaneceu até 1994. Antes disso, em 1973, em Paris, foi publicado o primeiro volume do seu romance de maior sucesso, o Arquipélago Gulag. Na obra, ele denunciou o sistema arbitrário do regime de Stalin, as prisões, os campos de trabalho forçado. Lutou para que sua obra não fosse instrumentalizada pelos adversários do regime. Era contra qualquer tipo de ideologia, comunista ou não. O que lhe importava era o ser humano. Dizia que “aquilo que rende inestimável e único o ser humano não vem da política, nem da ideologia, nem mesmo das suas próprias qualidades humanas, mas de algo que o homem traz dentro de si”. Solzhenitsyn chamava isso de alma. A fé em Deus - ele pediu para ser batizado em 1957 - o dotou de grande força moral e deu significado à sua missão de escritor. Mesmo após a dissolução da União Soviética, Solzhenitsyn continuou, por meio de seus escritos, a ser a consciência crítica da sociedade russa, fazendo-se porta-voz da dignidade e da liberdade infinita do ser humano.

Nenhum comentário: