O crescimento e controle da população ocupam lugar importante na agenda dos governos. Se tal afirmação é válida para todos os estados, pode-se imaginar a importância do tema para um país como a China que possui a maior população do mundo. Entre os séculos 18 e 19, na China, como em muitos outros estados, fazia parte da lógica da época a ideia que, quanto maior fosse o número de filhos, maior seria o poder econômico da família. O próprio Mao Zedong, nos anos 50, foi o responsável do boom demográfico incentivando os camponeses a ter mais filhos, futuros braços para o desenvolvimento rápido da agricultura e o consequente enriquecimento do país.
Nos anos 60, porém, o fracasso das campanhas lançadas por Mao e o crescimento desmesurado da população gerou problemas gravíssimos à economia do país. Diante disso, o governo tentou controlar o crescimento da população, mas esbarrou na mentalidade tradicional dos camponeses. Em 1978, Deng Xiaoping impôs a política do filho único. Quem aderisse a tal política receberia prêmios, como a garantia de ajudas econômicas à família, assistência sanitária e escolar gratuita. Quem desrespeitasse tal diretriz incorreria em sanções como multas, redução do salário dos pais, ou perda de benefícios ligados ao status do filho único. Lembro de ter conhecido, em Roma, um casal de jovens engenheiros chineses enviados pelo governo chinês numa empresa estatal italiana para um estágio.
A única filha ficou com os avós em Pequim. Eles contaram que queriam muito ter outro filho, mas que isso significaria o fim de suas carreiras, não teriam mais direito a promoções ou incentivos. A política do filho único alcançou sua meta de reduzir a taxa de natalidade, ao menos nas grandes cidades onde o controle consegue ser mais eficaz. Porém, com o tempo, apresentou alguns efeitos colaterais que estão gerando preocupação nas autoridades chinesas. O primeiro é o desequilíbrio numérico que se criou entre meninos e meninas. Desde a antiguidade, existe na China uma tradicional preferência pelos filhos meninos que garantem a continuidade da família.
Isso provocou, ao longo dos anos, atitudes gravíssimas como o assassinato das meninas recém nascidas e o aborto seletivo, muitas vezes clandestino. A desproporção atual entre homens e mulheres gerou outros problemas graves como a venda ou o sequestro de meninas, principalmente no interior da China. Outro efeito é o envelhecimento da população, que, se de um lado, reflete uma qualidade de vida melhor, de outro, constitui um aumento da despesa pública em matéria de aposentadoria e a diminuição de mão-de-obra disponível. Tais efeitos colaterais levaram as autoridades políticas de algumas regiões chinesas a inverter a rota após duas décadas de política do filho único. Quem inaugurou tal inversão de rota foi a região de Xangai, projeto piloto do crescimento econômico chinês.
A Comissão de Planejamento Familiar e Populacional de Xangai lançou uma campanha para incentivar casais a terem um segundo filho. Xangai foi escolhida para o lançamento dessa campanha inédita por ter 22% de habitantes com mais de 60 anos. Xie Lingli, diretor da Comissão de Planejamento Familiar, afirmou que a campanha apenas objetiva resolver o problema do crescente número de idosos, mas que isso não significa que o governo chinês queira rever a política de planejamento familiar. De fato, por enquanto, apenas os casais autorizados poderão ter um segundo filho. São sete as condições que permitem ter um segundo filho.
Dentre essas, uma é que os pais sejam filhos únicos, uma outra é que os cônjuges estejam registrados oficialmente como camponeses e tenham um filho do sexo feminino. Muitos casais ficaram felizes com a iniciativa do governo, sobretudo quem sofreu de solidão na infância pela ausência de irmãos ou irmãs. Outros, porém, mesmo estando entre o grupo de casais autorizados, afirmam que um dos maiores obstáculos é o peso econômico que um segundo filho comportaria na economia familiar. Mesmo com maior abertura, fatores culturais típicos do período moderno chinês, como o medo da perda da comodidade, certamente impedirão uma nova explosão demográfica na China.
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