quarta-feira, 1 de julho de 2009

Honduras e o fantasma do golpe de estado

Desde o último domingo, a população de Honduras enfrenta uma grave crise política. O presidente Manoel Zelaya foi obrigado pelas forças armadas a sair do país e encontra-se em exílio na Costa Rica. Roberto Micheletti, presidente do congresso de Honduras, fez-se nomear, imediatamente, presidente interino, declarando que permanecerá no poder até 29 de novembro, data prevista para as próximas eleições presidenciais. Foi o primeiro golpe de estado na América Latina após 16 anos de relativa tranquilidade política. Mas golpes de estado fazem parte da tradição política desse país, que é considerado o mais pobre após o Haiti.

Por meio de golpes de estado, diversos governos militares conseguiram derrotar governos reformadores interrompendo bruscamente as tentativas de reverter a condição de extrema pobreza de grande parte da população hondurenha. Nas suas relações externas, Honduras foi por longo tempo aliado dos Estados Unidos, que ali instalaram estrategicamente uma base militar para combater as forças sandinistas da Nicarágua. Os Estados Unidos costumavam apoiar os candidatos do Partido Nacional, de cunho conservador, contra os candidatos do Partido Liberal, mais próximos à população. Como de costume, em 2006, os republicanos americanos apoiaram a candidatura do nacionalista Porfírio Lobo. Porém, ele foi derrotado pelo candidato liberal, Manoel Zelaya, apoiado pelos democratas americanos. No poder, Zelaya inaugurou uma nova administração política.

Internamente, aumentou o salário mínimo, estreitando alianças com os setores populares do país, visando combater a exclusão social generalizada e a violência urbana, com índices entre os maiores do mundo. Com efeito, entre os anos de 1998 e 2005, foram contados 2.720 assassinatos de jovens entre 12 e 22 anos. Zaleya opôs-se à pena de morte como remédio para interromper tal ciclo de violência, acreditando que precisava combater as causas da violência identificadas na injusta distribuição de renda entre a população. Externamente, Zaleya aproximou-se da Venezuela, com o qual assinou tratados em matéria de petróleo.

Além disso, em 2008, ingressou na Aliança Bolivariana para as Américas (ALBA), da qual fazem parte Venezuela, Equador, República Dominicana, Nicarágua, Cuba. O ingresso nesta organização foi contrastado pela maioria do congresso, que acompanhava com desconfiança os novos rumos da política governamental, claramente em oposição às políticas conservadoras de salvaguarda dos interesses econômicos de banqueiros, empresários e latifundiários, que contam com o apoio político do poder judiciário e das forças armadas hondurenhas. Olhando a situação desse ponto de vista, as causas do enfrentamento entre o presidente Zelaya e os outros poderes nacionais parecem um pouco mais claras.

Zelaya queria fazer uma consulta quanto à possibilidade de colocar uma quarta urna no dia das eleições presidenciais, 29 de novembro, relativa a uma possível revisão da Constituição. Tal projeto serviu de pretexto para o golpe, que foi contra as reformas sociais pretendidas por Zelaya. O congresso apressou-se, no início da semana passada, em aprovar uma lei que proíbe a realização de consultas populares 180 dias antes ou depois das eleições nacionais, invalidando o projeto de Zelaya.

Observando atentamente as datas, conclui-se que a acusação do congresso de que Zelaya queria realizar a consulta de domingo para poder reeleger-se é infundada, pois não daria tempo para ele reeleger-se visto que a consulta relativa à mudança da Constituição aconteceria no mesmo dia das eleições presidenciais. Zelaya foi vítima do poder conservador das elites econômicas em busca de uma desculpa qualquer para tirá-lo do poder. Ao contrário de outros golpes, as forças conservadoras hondurenhas não receberam o apoio internacional esperado. Desta vez, o democrata Barack e o bolivariano Chavez estão do mesmo lado, contra o golpe.

5 comentários:

Anônimo disse...

http://pdba.georgetown.edu/Constitutions/Honduras/hond05.html

Eis o link da Constituição de Honduras. Há vários artigos que condenam a tentativa de reforma-la. Como por exemplo esse, abaixo:

Artigo 42: La calidad de ciudadano se pierde:
5. Por incitar, promover o apoyar el continuismo o la reelección del Presidente de la República.

A Destituição do presidente, romântica ou não, é constitucional.

Unknown disse...

Assim como o restante da comunidade internacional, Lula não reconhece o governo do presidente interino, Micheletti. Este, que depôs Zelaya de seu cargo, erroneamente, com um golpe de estado e não por meio de Impeachment, uma maneira mais digna e legal de uma deposição, pela tentativa de reforma na constituição hondurenha, aonde se refere que um presidente tem direito a quatro anos de mandato e nada mais. Eleito pela elite hondurenha, Zelaya prometia estatizações no seu país e aumentos de salário mínimo, o que assustou seus eleitores com o cumprimento da segunda. O Venezuelano, exilado por Micheletti na Costa Rica tentou voltar, infrutíferamente, ao seu país por duas vezes, tanto por ar como por terra. A questão é, que em seu sucesso de retorno “humilde” em um porta-malas, Manuel Zelaya escolheu estrategicamente a embaixada brasileira pelo fato da viagem de Lula para New York, onde o presidente brasileiro participaria da Assembléia da ONU, na qual poderia articular o apoio de chefes de Estados e pelo fato do Brasil exercer uma liderança em democracia. O que não pode deixar acontecer é pensar que o Brasil apoiou e financiou este retorno do presidente legítimo de Honduras a seu país e sim somente está agindo de forma a favor de princípios democráticos e para não perder o protagonismo na América Latina ante o avanço da política externa venezuelana. Um contraponto a Chávez.

.nati argiles disse...

Sabe-se que esta situação provocou mais transtorno do que o imaginado.
Por acolher o presidente deposto, Manuel Zelaya, na embaixada, o Brasil envolveu-se em uma difícil situação diplomática.

Por não reconhecer o governo de Micheletti como legítimo, o Brasil não pode fazer acordos com Honduras.

A Embaixada Brasileira em Honduras tornou-se um centro de onde o presidente deposto comanda seus apoiadores. Mesmo com a garantia de não sofrer mais ataques à Embaixada, as pessoas que ali estão encontram-se em uma difícil situação.

Caberá à capacidade diplomática brasileira em resolver estes conflitos.

Fabiano Severo disse...

Anna...
Bem como foi dito sobre esse caso, acho que o mundo que vivemos hoje não tem mais espaços para golpes de estado. A atitude do Lula não ter reconhecendo o governo interino aponta o um desapontamento com atitude tomada por Micheletti,e no momento em que Zelaya foi abrigado na embaixada brasileira, tambem aponta o lado adotado pelo Brasil, porem havia de ter algumas ressalvas, pois no momento que Zelaya levou mais 64 simpatizantes ele "abusou" da hospitalidade brasileira, e tornando o Brasil participante ativo dessa "trama" e podendo trazer consequencias negativas.

Unknown disse...

Tendo em vista a relação do Brasil com este fato, vale observar que, ao que parece, países como Venezuela, Honduras e Bolívia ficaram para trás na evolução da democracia, coisa que felizmente o Brasil já passou e superou, esses países vivem em uma relação totalmente infantil de disputas de poder absoluto e ditatorial, unicamente com o objetivo de se manter no poder e passar uma imagem de liderança forte e revolta com o resto do mundo, realmente assim fica difícil para o resto do mundo tomar a sério a América central e do Sul, já não bastava todo o atraso de Cuba que vive na miséria em busca de ideais utópicos já ultrapassados.
Neste ponto o Brasil está de parabéns, pois parece já ter adquirido a maturidade necessária para fazer uma democracia dar certo, estamos nos tornando ativos e representativos no cenário internacional.
Mas este caso de Honduras, na qual o Brasil acabou por entrar meio sem querer, pode se tornar maior do que parece, trazendo conflitos diplomáticos desnecessários ao momento que o nosso país vive.
Ao meu ver o Brasil está sendo usado como escudo, devido a boa vontade de não expulsar o Zelaya da embaixada brasileira, se ele quer asilo, que venha para o Brasil, e não use mais nossa embaixada já tão ultrajada por ter sido invadida por ele, virar cenário de politicagem e jogos de interesses como vem acontecendo.
A diplomacia de Lula trouxe muitos benefícios para nosso país, mas não podemos deixar que ela seja exagerada, não respeitada e usada por quem decidir se aproveitar da "boa vontade diplomática" que Lula tem adotado. Que ele saiba a hora de "puxar o freio" no momento que isso comece a trazer consequências prejudiciais ao Brasil.

Felipe Albornoz
Aluno de comex/RI