quinta-feira, 9 de julho de 2009

Pequim e a província muçulmana de Xinjiang

Domingo, 5 de julho, na cidade de Urumqi, capital da província chinesa de Xinjiang, o choque entre a polícia chinesa e um grupo de manifestantes provocou a morte de 140 pessoas e o ferimento de outras 800. A revolta parece ter surgido inicialmente como protesto pelo assassinado de dois muçulmanos de etnia uigur, na cidade de Cantão, no final de junho. Logo, porém, as manifestações revestiram-se de contornos nacionalistas pró-independência. O governo chinês reprimiu os protestos acusando grupos uigures do exterior de fomentar o movimento separatista na região justamente na véspera do G8. Como no caso do vizinho Tibete, também na região autônoma do Xinjiang, localizada no coração da Ásia Central, existem grupos separatistas que lutam há décadas pela independência do Turquistão Oriental ou Turquistão chinês, como é chamado por eles o Xinjiang.

Ao contrário de alguns dados imprecisos difundidos pela mídia, que afirma que o Xinjiang teria sido anexado em 1949 pelo governo comunista, esse território faz parte oficialmente da China desde 1758, quando da conquista por parte da dinastia Qing. Entre a queda da última dinastia chinesa, em 1911, e a proclamação da República Popular da China, Moscou tentou estender sua influência sobre a região, alimentando tentativas de separatismo. Uma vez no poder, os comunistas deixaram claro que o Xinjiang era parte integrante do território chinês, e por isso adotaram a política de enviar grupos pertencentes à etnia majoritária Han, para reforçar os vínculos culturais com aquela região tão distante da capital.

Para os chineses, de fato, o Xinjiang era uma terra inóspita, para onde eram enviados criminosos ou políticos banidos. Na época de tal forçado deslocamento, apenas 8% da população do Xinjiang era constituído por chineses da etnia Han. Atualmente, esses últimos constituem quase 40% dos 17 milhões de pessoas que habitam a região. Cerca da metade da população da região pertence a etnias minoritárias, todas muçulmanas, entre as quais se destaca a etnia uigur, acusada pelo governo de Pequim de fomentar o separatismo. A língua e cultura dos uigures provêm da Turquia, país que ainda hoje exerce profunda influência sobre as regiões centroasiáticas com seu ideal pantúrquico de uma única nação que iria da Europa dos Bálcãs até o Xinjiang.

Desde 1990, grupos islâmicos para a liberação da região do Xinjiang realizaram numerosos atentados em nome da guerra santa contra os infieis (jihad), o que resultou em um controle mais rígido por parte das autoridades chinesas. O governo de Pequim fechou as escolas islâmicas e permite o acesso às mesquitas somente para os maiores de 18 anos. A criação, em 2001, do Movimento Islâmico do Turquistão, uma formação extremista provavelmente financiada pela Al-Qaida e pelo narcotráfico, reforçou os argumentos de Pequim para reprimir qualquer tipo de manifestação popular.

É interessante notar que, ao contrário do Tibete, as repressões contra os manifestantes uigures não despertam tanta reprovação internacional. Talvez isso seja devido a dois fatores: o fato de os muçulmanos uigures não poderem contar com a figura carismática de um líder religioso como o Dalai Lama, e a desconfiança generalizada por parte do Ocidente em relação à criação de uma República Islâmica independente na Ásia Central. Contudo, há quem diga que a ação dos grupos de fundamentalistas islâmicos no Xinjiang seria usada como pretexto por parte de Pequim para reprimir qualquer tipo de manifestação popular contra o governo, mesmo se pacífica, como foi considerada a do último domingo.

Tais protestos seriam resultado do mal-estar generalizado entre a população muçulmana frente às políticas de Pequim que favoreceriam os imigrados chineses da etnia Han. De fato, eles possuem uma renda mais alta do que o resto da população, além de acesso a empregos públicos mais atraentes. A divisão inter-étnica, devido à presença “colonizadora” dos Han, é um elemento desestabilizador que Pequim não pode subestimar, tendo em conta a importância estratégica da região, rica em petróleo e gás, especialmente dentro das relações privilegiadas com os membros do grupo de Xangai (Rússia, China, Uzbequistão, Quirquistão, Tajdiquistão e Cazaquistão).

Um comentário:

Ciro Maratá disse...

Mais uma vez podemos ver a intolerância etnica/religiosa da China, que gera até mesmo conflitos armados, uma potência como a China deveria acolher e saber se relacionar com as etinias e religiões minoritarias e não atacar de forma armada ou não tentando expurgar da sociedade aquele que não a agradam ou não seguem seus preceitos como ela deseja