quarta-feira, 23 de abril de 2008

Um bispo na presidência do Paraguai

O porta-voz do Vaticano, Mons. Frederico Lombardi, definiu a eleição do bispo Lugo à presidência do Paraguai um fato inédito que chama a atenção, mesmo se afirmou não ter se surpreendido com a vitória de Lugo.

Mons. Fernando Lugo venceu as eleições no Paraguai com 40, 8% dos votos contra 30, 8 % da candidata Blanca Olevar, do Partido Colorado. O povo paraguaio colocou fim aos 61 anos de poder do Partido Colorado. Tal partido governou o país de 1947 a 2008, incluído o período da ditadura do general Alfredo Stroessner (1954-1989), também Colorado. Durante esses 61 anos no poder, o Paraguai tornou-se um dos países mais corruptos e mais pobres da América Latina. Estima-se que cerca de um milhão de paraguaios deixaram o país em busca de uma melhor qualidade de vida, e que destes, 200.000 deixaram o país por razões políticas. Fernando Lugo, líder da Aliança Patriótica para a Mudança (APC) apareceu como sinal de esperança para a população paraguaia. Nasceu no dia 30 de maio de 1951, em uma das regiões mais pobres do Paraguai, a região rural de São Pedro, a 400 quilômetros ao sul da capital do país, Assunção. Em 1977 foi ordenado sacerdote na Congregação do Verbo Divino. Logo após a ordenação sacerdotal foi trabalhar no Equador com o Mons. Leonidas Proaño, onde por cinco anos participou da coordenação da “Igreja dos pobres”, ligada à Teologia da Libertação. Quando voltou ao Paraguai, foi expulso pelas autoridades porque considerado perigoso para a paz social. Viajou então para Roma onde se dedicou aos estudos de teologia. Em 1994, foi consagrado Bispo de São Pedro, a sua diocese de origem. Com o objetivo de ajudar a população, deu vida ao movimento Tekojoja (que na língua Guarani quer dizer Igualdade). Em março de 2006, nasceu um movimento de resistência cidadã contra a intenção do presidente Duarte Frutos de modificar a Constituição para ser reeleito pela terceira vez. No dia 29 de março, Lugo convocou uma caminhada de protesto em Assunção em que participaram 45.000 pessoas. Naquela ocasião, diversas organizações e grupos políticos uniram-se para pedir sua candidatura. Em setembro, as pesquisas eleitorais já o colocavam como 1º candidato à presidência. Em resposta à solicitação popular, em dezembro do mesmo ano, Lugo anunciou sua renúncia à vida sacerdotal para concorrer às eleições políticas. O Vaticano, porém, não aceitou sua renúncia e decidiu suspendê-lo “a divinis” (o que significa, segundo o Código de Direito Canônico, que o sacerdote continua obrigado aos deveres a ele inerentes, embora esteja suspenso do ministério sacerdotal). Agora, depois de sua eleição, a Santa Sé deverá avaliar a melhor solução para este caso inédito. Contudo, como afirmou o porta-voz vaticano, “trata-se somente de uma questão jurídica sobre sua função na Igreja. Não é um problema de relações diplomáticas”.

Lugo deverá enfrentar agora a oposição acirrada do Partido Colorado que, durante a campanha eleitoral, o chamou de esquerdista, definindo-o aliado dos presidentes Morales, da Bolívia, e Hugo Chavez, da Venezuela, do qual teria recebido - segundo seus opositores - ajuda financeira. Lugo fez questão de se distanciar de posições esquerdistas, definindo-se um homem de centro. Em recente entrevista, declarou que entre seus objetivos políticos está a reconciliação nacional, política e social. “Chegou o momento – ele afirmou - de sentarmo-nos ao redor de uma grande mesa para resolver os nossos problemas e desenhar um projeto para o nosso país. Um desafio fundamental é o crescimento econômico, que ajudará a melhorar a igualdade social”. E, concluindo a entrevista, afirmou: “É impossível obter em pouco tempo aquilo que outros obtiveram em muitos anos. Mas eu continuo a ser otimista e confiar em Deus”. As boas intenções não lhe faltam, mas Lugo deverá trabalhar muito para construir um governo capaz de enfrentar a dura oposição que o presidente Duarte, até então no poder, prometeu fazer. Seu ponto fraco está justamente nos grupos e partidos políticos que o apoiaram: grupos de esquerda, centro e direita. Mas os eleitores estão do seu lado, apostaram nele com a esperança de poder finalmente virar página e construir uma história mais feliz para o povo paraguaio.

Nenhum comentário: