quarta-feira, 25 de março de 2009

As duas faces da política externa do segundo governo Vargas

Em outubro de 1950, Getúlio Vargas retornou ao poder “nos braços do povo”, tendo sido eleito por voto direto. Após o intervalo do governo Dutra, caracterizado por uma política externa de subordinação aos Estados Unidos, o presidente Vargas retomou o discurso nacional-desenvolvimentista ensaiado já no seu primeiro governo, como resposta às mudanças da sociedade brasileira daqueles anos. O projeto nacionalista visava a se realizar principalmente por meio do incremento da industrialização, modernização da agricultura e abertura de novos ramos de produção. Contudo, para alcançar tais objetivos, o Brasil precisaria atrair o máximo de capitais estrangeiros, quer por meio do comércio, da captação de empréstimos ou da obtenção de transferência de tecnologia. Nos primeiros anos da década de 50, apenas os Estados Unidos podiam oferecer ao Brasil o que Vargas buscava.

Entretanto, ele escolheu adotar uma política externa mais autônoma em relação ao tradicional aliado, que ficou conhecida como política de barganha. Já no início do segundo mandato de Vargas, os Estados Unidos, empenhados na Guerra da Coréia para rechaçar as forças comunistas além do 38º paralelo, pediram o apoio diplomático e militar de seus aliados, principalmente na América Latina, buscando, desta forma, constituir um grupo alinhado política e economicamente contra o comunismo internacional. Vargas aproveitou tal pedido para reivindicar o incremento das ajudas americanas. Propôs, então, a criação de uma Comissão Mista Brasil - Estados Unidos para o Desenvolvimento Econômico.

Os Estados Unidos concordaram com tal pedido e a comissão ganhou vida em julho de 1951, integrando técnicos dos dois países que iriam trabalhar em favor do desenvolvimento econômico do Brasil. No mesmo ano, porém, Vargas apresentou dois projetos cujo caráter nacionalista comprometeu as relações aparentemente amigáveis entre os dois países: o primeiro projeto foi a criação da Petrobras e o segundo a regulamentação da remessa de lucros pelas empresas estrangeiras estabelecidas no Brasil visando reduzir a fuga dos capitais estrangeiros.

As duas iniciativas não somente foram rotuladas pelos norte-americanos como concessões aos grupos de esquerda do país, mas agravaram a divisão interna já existente no Brasil entre os grupos nacionalistas e os grupos apelidados de “entreguistas” que defendiam o alinhamento automático do Brasil aos EUA e a abertura ao capital estrangeiro. Durante todos os anos de seu segundo governo, Vargas teve que atuar uma política externa caracterizada por um jogo duplo, ora favorável aos grupos nacionalistas ora em sintonia com os entreguistas. A razão de tais escolhas foi a necessidade de responder às necessidades nacional-desenvolvimentistas do país, mas sem chegar a uma ruptura com o único país que podia realmente ajudar o Brasil.

Com as armas da barganha, Vargas tentou ensaiar aberturas diplomáticas em direção aos países da Europa Ocidental, e até às nações do leste Europeu, mas foi mais uma espécie de chantagem diplomática, instrumento de pressão sobre o governo estadunidense, do que uma verdadeira multilateralização da diplomacia brasileira. Se, de um lado, a recusa de enviar tropas brasileiras a Coréia agradou aos nacionalistas, de outro, a assinatura do acordo militar entre Brasil e Estados Unidos foi julgado como uma traição de Vargas. Além disso, Vargas aceitou fornecer aos Estados Unidos minerais atômicos brasileiros em troca da promessa de financiamento para a economia brasileira. Os grupos nacionalistas exigiam em troca, também, a transferência de tecnologia e equipamento para o desenvolvimento de uma indústria nacional de energia atômica.

Quando os Estados Unidos negaram tal pedido, Vargas decidiu buscar ajuda junto a empresas privadas alemãs e francesas, mas a conjuntura de então não permitiu que se chegasse a resultados concretos. A situação precipitou em 1953. Nos Estados Unidos, a eleição de Eisenhower significou o fim de um discurso mais aberto ao projeto nacionalista de Vargas. A Comissão Mista Brasil - Estados Unidos foi extinta. A criação, no mesmo ano, da Petrobras e da Eletrobrás irritou ainda mais os Estados Unidos.

Dentro do Brasil, a crescente crise econômica, a perda da base de sustentação do governo e a mobilização popular em torno da questão do petróleo enfraqueceram a atuação do governo de Vargas, levando a um acirramento da divisão interna no país. A sua tentativa de conciliação e de união entre os dois grupos em favor do crescimento nacional não teve o sucesso esperado. Em agosto de 1954, em meio a pressões internas e externas, Vargas suicidou-se.

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