terça-feira, 8 de janeiro de 2008

A difícil situação dos católicos na China

Quem nunca ouviu falar do crescimento econômico sem igual da China? Quantas vezes já escutamos a notícia de delegações do governo federal brasileiro, ou dos nossos estados, realizando visitas à China, fechando acordos ou tentando se proteger da invasão dos produtos chineses? Se já adquirimos noções da economia deste gigante asiático, talvez ainda nos falte conhecer o que acontece com a religião e a difícil situação que os católicos chineses ainda hoje enfrentam na China.

A história do cristianismo na China tem raízes distantes, começando já no longínquo ano de 635 d.C. A Igreja Católica na China passou por longos períodos de perseguição e de tolerância devido às mudanças das várias dinastias imperiais. Graças também à obra de numerosas congregações religiosas - dentre outras os franciscanos, os jesuítas e os vicentinos - a Igreja Católica conseguiu reforçar e difundir a sua presença no país.

A Santa Sé estabeleceu relações diplomáticas com a República da China, então governada pelo Partido Nacionalista, somente em 1942 e por poucos anos. De fato, em 1951, a ditadura comunista, instaurada por Mao Zedong, marcou o fim destas relações, atitude esta que causou a expulsão em massa de todos os estrangeiros, inclusive missionários e religiosos que há anos trabalhavam na China. À expulsão dos missionários estrangeiros seguiu a perseguição dos bispos, padres, religiosos e religiosas chineses. As igrejas foram fechadas ao culto e as propriedades católicas expropriadas pelo governo chinês. O Vaticano foi considerado pelos comunistas como uma potência estrangeira qualquer que, ao lado das outras potências ocidentais, era acusado de ter explorado e escravizado o povo chinês durante décadas.

A China adotou uma política de reabertura ao resto do mundo, a modernização tomou conta de todos os setores do país. As comunidades religiosas também se beneficiaram desta abertura, mas tiveram que aceitar as condições oferecidas pelo governo. Deng Xiaoping queria demonstrar ser capaz de dar espaço a todos, inclusive às comunidades religiosas, desde que estas aceitassem formar junto com o governo chinês uma Frente Unida para trabalhar pela construção de uma nova China.

Nem todos os católicos, porém, confiaram em tal demonstração de tolerância. Era de fato uma liberdade religiosa que não deixava espaço a qualquer tipo de divergência e que mantinha sob controle todas as tentativas de comunicação com o Vaticano, considerado ainda como um elemento perigoso para a independência chinesa. Organismos governamentais receberam do governo a tarefa de administrar os assuntos religiosos, que incluía a intervenção na nomeação dos bispos católicos chineses, pois o governo chinês julgava inadmissível que o chefe político de outro Estado, como era considerado o Papa, pudesse nomear os administradores de comunidades católicas chinesas (os bispos). A questão da nomeação sempre foi um dos pontos-chave das complicadas relações entre a Santa Sé e o governo chinês gerando não poucos problemas para a comunidade católica chinesa.

Ao longo de décadas, acabaram se formando na China três grupos de bispos. O primeiro formado por uma minoria que, sob convite do governo comunista havia aceitado cortar completamente as relações com o Papa, e queria formar uma Igreja Católica independente. O segundo grupo, majoritário, era formado por bispos que haviam escolhido permanecer ao lado do governo chinês no intuito de salvar como podiam as sementes do catolicismo na China. Muitos destes bispos, nomeados sem a aprovação do Vaticano, procuravam secretamente, após sua consagração episcopal, o consentimento do Papa restabelecendo, em segredo, a comunhão com ele. O terceiro grupo era constituído por aqueles bispos que escolheram a clandestinidade por não se submeterem ao controle do governo comunista. Muitos deles foram torturados e jogados na cadeia, onde passaram mais de vinte anos. Estes grupos eram seguidos por milhares de católicos, também divididos entre eles.

Todos os papas, de Pio XII a João Paulo II, tentaram manter o diálogo não somente com as autoridades chinesas, mas, também, com as diversas comunidades da Igreja Católica na China. Cartas, orientações, diretrizes foram enviadas às comunidades chinesas. Algumas destas diretrizes vaticanas, que queriam ajudar a Igreja Católica a não sucumbir sob o controle total por parte do governo chinês, demonstraram-se, porém, como facas de dois gumes.

Em 1978, por exemplo, a Santa Sé emitiu um documento que concedia poderes especiais aos bispos e ao clero católico reduzindo ao mínimo as obrigações formais. Com base em tal documento os bispos poderiam ordenar sacerdotes homens católicos de conhecida e comprovada virtude mesmo que não tivessem recebido uma educação teológica formal. A este documento, poucos anos depois, se acrescentou a decisão de João Paulo II de permitir que os bispos clandestinos pudessem consagrar outros bispos mesmo quando, por razões de segurança, não conseguissem obter a aprovação da Santa Sé. A partir daí as ordenações de padres clandestinos sem a devida formação teológica e a consagração de bispos católicos clandestinos cresceram vertiginosamente reforçando as fileiras da comunidade católica clandestina que, sentindo-se mais forte, passou a combater e, muitas vezes, também a difamar as comunidades católicas “oficiais”, definindo-as como ninho de pecadores. O governo comunista, diante de tal situação, emitiu vários documentos oficiais para tentar derrotar as comunidades clandestinas consideradas como infiltração do Vaticano na China.

Até a sua morte, em 2005, o papa João Paulo II tentou dialogar com as autoridades chinesas, com os bispos, com os católicos chineses para que todos trabalhassem por uma reconciliação. Durante os 26 anos de seu pontificado ele dirigiu-se à China 60 vezes, entre discursos oficiais, mensagens e saudações.

Bento XVI seguiu os passos do seu predecessor e há pouco tempo escreveu a sua primeira carta aos católicos chineses. Com a delicadeza e a extraordinária inteligência que o caracterizam ele conseguiu dirigir-se aos seus interlocutores como se cada um fosse o único, convidando todos os católicos para trabalhar pela unidade da comunidade católica na China. Na carta ofereceu orientações precisas, não deixando espaço a dúvidas ou divisões, contribuindo para aquietar os ânimos e colocar as bases para uma futura reconciliação entre os católicos das comunidades oficiais e clandestinas. As dificuldades ainda permanecem, mas alguns sinais - como a recente consagração episcopal do novo bispo de Pequim, realizada com a aprovação conjunta do governo e da Santa Sé - parecem confirmar o desejo de Bento XVI de uma normalização das relações entre os católicos e da Santa Sé com o governo de Pequim.

Um comentário:

Ciro Maratá disse...

o Papa Bento XVI está no caminho certo para as negociações com a China, mesmo tendo sido um Papa muito querido pelo povo João Paulo II não teve exito nessa questão. Espero que Bento XVI consiga melhorar o relacionamento da Santa Sé com a China, pois essa perseguição prejudica muito a evangelização do País.